O relatório final da Comissão Especial que analisa o PL (Projeto de Lei) Nº 3267, de 2019, proposto pelo Governo em junho último, trazendo mudanças ao CTB (Código de Trânsito Brasileiro), quer transferir para os municípios a responsabilidade do emplacamento dos ciclomotores, que hoje é de competência dos Estados (Detrans). Essa mudança preocupa os técnicos do OBSERVATÓRIO Nacional de Segurança Viária.
O documento alega que a incumbência poderá incentivar os municípios a se integrarem ao SNT (Sistema Nacional de Trânsito), obrigação já prevista no CTB desde sua publicação em setembro de 1997. Além disso, o relatório ainda dispensa os motociclistas desses veículos de cursarem os CFCs para a obtenção da ACC.
Essa semana, o OBSERVATÓRIO enviou um ofício ao presidente deputado Luiz Carlos Mota, ao relator Juscelino Filho (DEM/RJ) da Comissão Especial, com cópia para o presidente da CVT (Comissão de Viação e Transportes), deputado Eli Correia Filho para que o atual texto sobre esse assunto no Relatório final, seja alterado e essa mudança não se concretize.
Há que se destacar que o tema não foi apresentado, defendido ou sequer mencionado em qualquer das Audiências Públicas convocadas pela Comissão Especial que trata do tema, não tendo sido possível registrar naquelas oportunidades as nocivas consequências de tal mudança legal.
Veja abaixo parte do texto do ofício entregue pelo Observatório:
Texto apresentado pelo relator:
“O substitutivo inova também ao conferir competência aos municípios para registrar e emplacar os ciclomotores, hoje designada aos órgãos de trânsito estaduais. Esperamos que essa alteração sirva de incentivo para que os pequenos municípios se integrem ao SNT. A assunção dessa atividade pelos municípios menores facilitará a vida dos seus cidadãos, ao evitar que se desloquem até a sede ou regionais dos órgãos estaduais de trânsito para efetuar o registro e emplacamentos dos ciclomotores. Ainda com relação a esses veículos, propomos dispensar o candidato à obtenção da Autorização para Conduzir Ciclomotores (ACC) de participar do curso teórico-técnico e do curso de prática de direção veicular. O objetivo é baratear o custo da obtenção da ACC, trazendo para a legalidade milhares de condutores que hoje, em razão dos altos valores, pilotam os ciclomotores sem documento de habilitação”.
Esta proposta não retrata a realidade da gestão pública de trânsito nos municípios brasileiros, pois a alegação de que servirá como “incentivo para os pequenos municípios se integrarem ao SNT” não se justifica. Os pequenos municípios, que representam 75% daqueles que ainda não estão integrados ao SNT, são justamente onde vivem 50% dos habitantes do país. Como lhes faltam recursos técnicos e financeiros, tais municípios estão impossibilitados de absorver as atividades previstas tanto na municipalização do trânsito quanto na gestão dos ciclomotores proposta pelo relator.
Outra justificativa, do relatório é de que “a assunção dessa atividade pelos municípios menores facilitará a vida dos seus cidadãos, ao evitar que se desloquem até a sede ou regionais dos órgãos estaduais de trânsito para efetuar o registro e emplacamentos dos ciclomotores”. Essa proposta, além de difícil implantação, demandando o desenvolvimento de 5.570 sistemas independentes de controle veicular, é de custo extremamente elevado para a sociedade e isso poderá gerar o descontrole dos ciclomotores circulando nos municípios, pois tais veículos não terão identificação que permita uma fiscalização eficiente, aumentando significativamente o número de infrações de trânsito e acidentes delas decorrentes.
E outro ponto extremamente preocupante é a proposta de “... dispensar o candidato à obtenção da Autorização para Conduzir Ciclomotores (ACC) de participar do curso teórico-técnico e do curso de prática de direção veicular. O objetivo é baratear o custo da obtenção da ACC...”. Não submeter os condutores de ciclomotores a cursos teóricos sobre o funcionamento do trânsito e práticos de direção, aumentará o risco de exposição desses condutores ao cometimento de infrações de trânsito, até mesmo por absoluto desconhecimento das regras de trânsito, e acidentes delas decorrentes.
Estudos realizados pelo Observatório Nacional de Segurança Viária demonstram que o modal ciclomotor apresenta risco muito maior de acidentes com óbito e sequelas graves quando comparado com a motocicleta e os demais modais automotores, vide quadro abaixo:
Finalizamos relatando que os gastos realizados com atendimento aos condutores de motocicletas e ciclomotores nos últimos 10 anos pelo DPVAT :
Há que se cuidar para que o cidadão não se torne um escravo da burocracia do Estado Brasileiro, mas isto jamais poderá ser motivo para tirarmos os mecanismos de proteção à vida que estão estabelecidos no Código de Trânsito Brasileiro. Passar aos municípios uma tarefa que já é cumprida pelos Estados, sem dar aos entes municipais os meios (tecnológicos, humanos, financeiros e administrativos) para que tal responsabilidade seja exercida é uma forma de atentar contra a vida de todos os cidadãos que terão que conviver com mazelas inaceitáveis no trânsito, decorrentes de tal decisão.
Veja abaixo o ofício completo:
https://www.flipsnack.com/observatorio/of-cio_260_onsv_2019_comiss-oespecial_ciclomotores_cvt.html
E o parecer do OBSERVATÓRIO:
https://www.flipsnack.com/observatorio/parecer-ciclomotores.html
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