Desde o início da humanidade, o ser humano evolui a cada dia que passa. Ademais, desenvolve-se e aprimora sua forma de locomoção. No início, deslocava-se a baixas velocidades. À medida que o tempo avançou, novas tecnologias surgiram, proporcionando um deslocamento de automóveis com velocidades maiores.
A evolução e o desenvolvimento humano promoveram a concentração das pessoas e a formação das cidades, criando uma densidade populacional. A partir disso, duas situações agravaram-se com o tempo no trânsito, tornando-se enormes desafios para a sociedade:
- Corpos móveis (veículos), deslocando-se com alta carga de energia cinética;
- Corpos frágeis (pessoas), compartilhando o mesmo espaço físico dos veículos.
A Energia não pode ser criada nem destruída, apenas transformada de uma forma em outra, princípio físico da conservação de energia. Dessa forma, num contato de um corpo móvel com grande quantidade de energia cinética com um corpo frágil, teremos a transformação. Parte dessa energia transforma-se em energia térmica e é dissipada através do calor. Outra parte é transformada em energia sonora. Por último, uma parte dessa energia causa deformação que pode ser tanto elástica quanto inelástica. Devido à fragilidade do corpo humano, este não consegue absorver essas transformações, o que acarreta consequências graves e, inclusive, a perda da vida.
Outra Grandeza Física a ser considerada nesse fenômeno trágico é a Velocidade, que provoca um aumento exponencial na energia cinética. A título de exemplificação, consideremos um veículo de 1000 kg, inicialmente a 36 km/h. Para determinar o valor da energia cinética, utilizamos a expressão matemática EC = m.v²/2. Na sequência, demonstraremos o que acontece com a energia cinética quando dobramos e triplicamos a velocidade sem alterarmos a mesma massa, ou seja, estamos pensando no mesmo veículo.
Padronizando a velocidade no Sistema Internacional de Unidades (S.I), para calcular a Energia Cinética, teremos:
VA = 36 km/h = 10 m/s
ECA = m. vA²/2
ECA = 1000.10²/2 = 50.000 joules = 50 KJ
Agora vamos dobrar a velocidade para 72 quilômetros por hora,
VB = 72 km/h = 20 m/s
ECB = m. vB²/2
ECB = 1000.20²/2 = 200.000 joules = 200 KJ
Triplicando a velocidade de 36 quilômetros por hora para 108 quilômetros por hora:
VC = 108 km/h = 30 m/s
ECC = m. vC²/2
ECC = 1000.30²/2 = 450.000 joules = 450 KJ
Portanto, foi possível observar que, ao se dobrar a velocidade de um veículo, sua energia cinética aumenta quatro vezes, e quando triplica essa velocidade a energia cinética aumenta nove vezes. Evidencia-se a importância da gestão da velocidade para a minimização dos efeitos na transformação de energia cinética num evento de sinistro no trânsito.
Os sinistros de trânsito trouxeram transtornos enormes para a sociedade no século passado. Isso proporcionou a união de toda a população mundial na busca de soluções, já que, se nada fosse feito, em breve os sinistros de trânsito seriam responsáveis pela maior causa de morte no mundo. Sendo assim, tivemos a primeira reunião mundial para traçar diretrizes e metas para o controle e a redução do número de mortes no trânsito. Esse período foi a Primeira Década de Ações para Segurança no Trânsito, com a meta de redução de 50% no número de mortes, de 2011 a 2020. Depois, em 2021, foi instituída a segunda década, propondo uma nova redução de 50% até 2030.
Com base nisso, evoluímos na questão de segurança no trânsito e muitas ações foram e estão sendo adotadas em vários eixos de ações. No Brasil, foi criado um plano de ações, o PNATRANS, que hoje é dividido em 6 pilares de atuação, que são: gestão da segurança no trânsito, vias seguras, segurança veicular, educação para o trânsito, atendimento às vítimas e normatização e fiscalização. Cada pilar tem sua importância e eficiência, não eximindo a criação e o desenvolvimento de outras ações.
Em fatos que envolvem corpos com alta carga de energia cinética e que compartilha o mesmo espaço de corpos frágeis, é indispensável que seja feita a separação dos fluxos, evitando assim o contato. Essa parte deve ser considerada e contemplada na elaboração dos projetos e, posteriormente, disponibilizadas aos gestores, pois a segurança das pessoas é uma prioridade, mesmo que isso aumente uma porcentagem de recursos na execução do projeto.
É importante pensar no fluxo dos veículos levando em consideração sempre o possível fluxo de pedestres e de ciclistas, principalmente em áreas urbanas. A grande missão dos profissionais é a de pensar em um espaço físico onde seja minimizado ao máximo a possibilidade de contato entre corpos com alta energia e velocidade e os corpos frágeis, como pedestres e ciclistas. Com isso, já reduziríamos o número de atropelamentos que têm um valor elevado no país.
As situações aqui referidas são indispensáveis para o gerenciamento do fluxo dos veículos, pois conseguimos refletir sobre o possível contato de corpos que envolvam a transferência de energia. Os veículos de grande massa possuem grandes energias cinéticas, bem como os veículos leves de pequenas massas e grandes velocidades, já que a energia cinética aumenta linearmente com a massa, e essa mesma energia aumenta quadraticamente com a velocidade, conforme demonstrado acima. Outrossim, veículos mais leves, como motocicletas e automóveis, sofrem mais com a deformação causada pela transformação de energia num evento sinistroso. Sendo assim, é importantíssima a gestão desses fluxos.
Além disso, precisamos de vias em condições de circulação, ou seja, não podemos mais conviver com vidas perdidas por sinistros ocasionados por condição ruim da via. Alguns ajustes são extremamente necessários, como: largura da via compatível com o fluxo de veículos, sinalizações eficientes, áreas de escape, sonorizadores, barreiras que ajudem o condutor a seguir as regras de circulação, como os cilindros delimitadores nos locais críticos onde é proibida a ultrapassagem, entre outros artifícios da engenharia a favor do trânsito e da vida.
Com tudo isso, qualquer ação em prol da vida deve ser considerada. A engenharia tem soluções para o fenômeno físico tratado. Grande parte das soluções dos problemas no trânsito perpassa pela engenharia. Precisamos explorar esse universo, investir mais em soluções práticas que atuem na causa física do evento; criar estratégias e artifícios que ajudem evitar o contato que causa a transformação de energia, principalmente, para que os efeitos dessa transformação sejam minimizados. Enfim, a engenharia de tráfego deve buscar em primeiro lugar a proteção da vida, que é o bem maior.
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